“A 1 de Fevereiro o povo de Cabinda comemora duas traições. A primeira foi quando os portugueses decidiram ignorar as aspirações do nosso povo oferecendo Cabinda a Angola em 1975. A segunda é a de os portugueses persistirem ainda hoje no silêncio ignorando os compromissos que assumiram com o povo de Cabinda quando assinaram o Tratado de Simulambuco”, diz a FLEC/FAC em comunicado enviado ao Folha 8.
Por Orlando Castro
“O Tratado de Simulambuco é e será o manifesto secular da identidade do povo de Cabinda e a afirmação da sua soberania como nação. Passados 134 anos da assinatura do Tratado de Simulambuco o povo de Cabinda continua a honrar os seus notáveis e representantes que firmaram o tratado, enquanto Portugal conspurca a sua história, os seus compromissos e a sua honra”, refere o comunicado.
Diz a FLEC/FAC que, “134 anos depois Cabinda continua algemada ao colonialismo, não dos portugueses mas dos angolanos. 134 anos depois Cabinda continua a ser humilhada e o seu povo reprimido, privado de liberdade e de palavra. Mas 134 anos depois Cabinda mantém-se erguida contra a tirania, a opressão e a ocupação”, acrescentando: “Somos um povo nobre que assinou um nobre Tratado. Somos um povo que permanece erguido e firme na resistência contra todos os opressores”.
De acordo com a Frente de Libertação do Estado de Cabinda, “hoje, como no passado, o Povo de Cabinda tem de manifestar orgulho das suas origens, identidade, história, dignidade e acreditar que a nossa maior força está na nossa unidade e no combate armado ou pacífico para que sejam cumpridas as nossas aspirações e honrados os nossos antepassados”.
Uma velha (mas sempre nova) luta
Os cabindas continuam a reivindicar, e desde 1975 fazem-no com armas na mão, a independência do seu território. No intervalo dos tiros, e antes disso de uma forma pacífica, nomeadamente quando Portugal anunciou, em 1974, o direito à independência dos territórios que ocupava, a população de Cabinda reafirmou que o seu caso nada tem a ver com Angola.
Em termos históricos, que Portugal parece teimar em esquecer, Cabinda estava sob a «protecção colonial», à luz do Tratado de Simulambuco, pelo que o Direito Público Internacional lhe reconhece o direito à independência e, nunca, como aconteceu, à integração coerciva em Angola.
Relembre-se aos que não sabem e aos que sabem mas não querem saber, que Cabinda e Angola passaram para a esfera colonial portuguesa em circunstâncias muito diferentes, para além de serem mais as características (étnicas, sociais, culturais etc.) que afastam cabindas e angolanos do que as que os unem.
Acresce a separação física dos territórios e o facto de só em 1956, Portugal ter optado, por economia de meios, pela junção administrativa dos dois territórios.
Com perto de dez mil quilómetros quadrados, Cabinda é maior que S. Tomé e quase do tamanho da Gâmbia. Possui recursos naturais que lhe garantam, se independente, ser um dos países mais ricos do Continente. A nível agrícola, das pescas, pecuária e florestas tem grandes potencialidades mas, de facto, a sua maior riqueza está no subsolo: Petróleo, diamantes fosfatos e manganês.
A procura da independência data, no entanto, de 1956. Quatro anos depois da união administrativa com Angola, forma-se o Movimento de Libertação do Enclave de Cabinda (MLEC) e em 1963, dois anos depois do início da guerra em Angola, são criados o CAUNC – Comité de Acção da União Nacional dos Cabindas e o ALLIAMA – Aliança Maiombe.
A FLEC – Frente de Libertação do Enclave de Cabinda é fundada nesse mesmo ano, como resultado da fusão dos movimentos existentes e de forma a unir esforços que sensibilizassem Portugal para o desejo de independência. Era seu líder Luís Ranque Franque.
Alguns observadores referem, a este propósito, que o programa de acção da FLEC (elaborado na altura da junção de todos os movimentos cabindas) era nos aspectos político, económico, social e cultural muito superior aos dos seus congéneres angolanos, MPLA e UPA.
Cabinda, ao contrário do que se passou com Angola, foi «adquirida» por Portugal no fim do Século XIX, em função de três tratados: o de Chinfuma, a 29 de Setembro de 1883, o de Chicamba, a 20 de Dezembro de 1884 e o de Simulambuco, a 1 de Fevereiro de 1885, tendo este anulado e substituído os anteriores.
Recorde-se que estes tratados foram assinados numa altura em que, nem sempre de forma ortodoxa, as potências europeias tentavam consolidar as suas conquistas coloniais. A Acta de Berlim, assinada em 26 de Fevereiro de 1885, consagrou e reconheceu a validade do Tratado de Simulambuco.
No caso de Angola, a ocupação portuguesa remonta a 1482, altura em que Diogo Cão chega ao território. E, ao contrário do que se passou em Cabinda, a colonização portuguesa em Angola sempre teve sérias dificuldades e constantes confrontos com as populações, de que são exemplos marcantes, nos séculos XVII e XVIII, a resistência dos Bantos e sobretudo da tribo N´ Gola.
É ainda histórico o facto de a instalação dos portugueses em Angola ter sido feita pela força, sem enquadramento jurídico participado pelos indígenas, enquanto a de Cabinda se deu, de facto e de jure, com a celebração dos referidos tratados, subscritos pelas autoridades vigentes na potência colonial e no território a colonizar.
Segundo a letra e o espírito do Tratado de Simulambuco, assinado por príncipes, governadores e notáveis de Cabinda (e pacificamente aceite pelas populações), o território ficou «sob a protecção da Bandeira Portuguesa».
Vinte cruzes e duas assinaturas de cabindas e a do comandante da corveta «Rainha de Portugal», Augusto Guilherme Capelo, selaram o acordo.
Duvida-se que a terminologia jurídica de então, e constante do tratado, tenha sido percebida pelos subscritores cabindas. No entanto, crê-se que a síntese do texto tenha sido entendida, já que se referia apenas à «manutenção da autoridade, integridade territorial e protecção».
No contexto histórico da época, o Tratado de Simulambuco reflecte tanto à luz do Direito Internacional como do interno português, algo semelhante ao dos protectorados franceses da Tunísia e de Marrocos.
Apesar da anexação administrativa, Cabinda sempre foi entendida por Portugal como um assunto e um território distintos de Angola. A própria Constituição Portuguesa, de 1933, cita no nº 2 do Artigo 1 (Garantias Fundamentais), Cabinda de forma específica e distinta de Angola.
Partindo desta realidade constitucional, a ligação administrativa registada em 1956 nunca foi entendida como uma fusão com Angola. Nunca foi, não é nem poderá ser por muito que isso custe tanto ao MPLA como à UNITA, embora mais ao primeiro do que à segunda.
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Não é aceitável que gente da FLEC, qualquer que seja a FLEC, faça declarações semelhantes. Trata-se aí de uma injúria feita a todos os Cabindas traídos precisamente pelo senhor Henriques Tiago Nzita (FLEC) em 1974. Quem não se lembra que logo após a Revolução dos Cravos (25 de Abril de 1974), Portugal fez tudo quanto foi possível para negociar, com a FLEC, o processo da ascensão de Cabinda à independência? Entre Maio de 1974 e Setembro de 1974, Spínola primeiro convidou a FLEC para negociações em Cabinda. Tiago Nzita e senhora Denett, eis a delegação da FLEC que foi a Cabinda para este fim. A delegação Portuguesa fez a seguinte proposta à FLEC: Assinemos um acordo no qual Portugal reconhece o direito de Cabinda à independência dentro de cinco anos; ao longo desses cinco anos, Portugal compromete-se a urbanizar o território de Cabinda no seu todo, ao mesmo tempo que se irá fazendo a transição do poder. Ao cabo dos cinco anos, os Cabindas passarão a ter todo o poder e a experiência necessária entre as mãos. A delegação Portuguesa sublinhou o seguinte: “Angola tem três movimentos de libertação apoiados por potências que se opõem ideologicamente e prevemos uma guerra civil em Angola; e este não é o caso em Cabinda; por não ser o caso em Cabinda, Portugal deseja tirar os Portugueses de Angola e colocá-los cá em Cabinda; para Portugal, isso custa-nos menos, e porque muitos dos Portugueses a viverem em Angola não têm condições na metrópole; para Cabinda, esses Portugueses têm qualificações suficientes para contribuírem no desenvolvimento de Cabinda.” A resposta de Tiago Nzita, vice-presidente da FLEC, foi categórica: “queremos independência incondicional, imediata e completa”. Com esta frase a repetir-se, a delegação da FLEC abandonou a sala, entrou nas viaturas e rumaram para o Congo-Kinshasa. E enquanto caminhavam, exortavam as populações a atacarem os Portugueses em Cabinda por forma a obrigar Portugal a aceitar a “independência incondicional, imediata e completa”. Ninguém se lembra disso? Meu pai, então motorista do Coronel Soares Moura, assistiu as negociações pois o Coronel Soares Moura foi membro da delegação Portuguesa. Esta falhou! Porém, Spínola tentou um segundo encontro, desta vez, com o próprio Presidente da FLEC, a saber: Luís Ranque Franque. Este último foi convidado, por telegrama, à Ilha do Sal em Cabo Verde, para negociar p processo da ascensão de Cabinda à independência. As negociações foram marcadas para o dia 15 de Setembro de 1974. Mobuto Sese Seko, íntimo amigo de Tiago Nzita, impediu Ranque Franque a deslocar-se à Ilha do Sal. No lugar de Franque, Mobuto foi à Ilha do Sal, onde surpreendeu o Presidente Spínola. Mobuto disse a este último que tinha um acordo, com os Cabindas, que advogava a anexação de Cabinda ao território Congolês. E é verdade que esse acordo foi secretamente assinado entre Tiago Nzita e Mobuto. Importa saber o que Álvaro Cunhal disse a respeito do encontro entre Spínola e Mobuto na Ilha d em Cabo Verde. Frustrados por Nzita e Mobuto, os “Portugueses “optaram por deixar Cabinda entre as mãos dos Angolanos através dos Acordos de Alvor. Então, quem é que mais traiu Cabinda, a FLEC (Nzita) ou Portugal?
https://cabindastruggle.files.wordpress.com/2019/01/call-on-germany-to-shoulder-her-responsibility.pdf